sábado, 1 de março de 2008

1 - O TIPO E O GRAU DE SEGURANÇA

Por Gregorio F. Baremblitt


Todas as nações contemporâneas republicanas e democráticas, seja qual for o “tipo” de democracia que pratiquem (presidencialista, parlamentarista, etc.), sustentam uma série de organismos e subscrevem uma quantidade de leis, que lhes provêem uma certa sensação de unidade, de reconhecimento recíproco e de confiança mútua. Todas essas medidas coletivas costumam condensar-se em experiências de segurança, de diversos tipos e graus.
A variedade desses tipos e graus de experiência de segurança é imensa e dentro de seu amplíssimo espectro, a constatação de uma identidade de nacionalidade (sempre que se trate de populações em estado de direito e sem conflitos separatistas em curso ou recentes) quase sempre tem sido sentida como imediata e importante.
É de surpreender-se a medida que a existência nas grandes e até nas médias cidades “civilizadas” na atualidade perdeu essa feição de proximidade, de confiança espontânea e de segurança.
Para tratar de expressá-lo de outra maneira: Perceber que um interlocutor ou um interator social circunstancial desconhecido é um conacional apenas costuma levar a uma tendência a ser com ele um pouco mais “educado” ou “urbano” que com o resto dos congêneres em cena.
Necessita-se de uma copermanência e uma interrrelação relativamente prolongada para poder animar-se a solicitar dessas pessoas, por exemplo, “que tomem conta de nossa bagagem pesada quando entramos no toalete do aeroporto (ou estação de transportes)”. 
Esse exemplo que acabo de dar, que pareceria demonstrativo e conhecido dez anos atrás, cria desconfiança e insegurança não já como episódio realmente ocorrido, senão apenas como relato, ao qual se atribui querer ser convincente. E é absolutamente óbvio que deve ser assim, à medida que as paredes do citado aeroporto, seguramente devem estar “recheadas” de avisos que advertem enfaticamente aos passageiros não receberem sob seus cuidados nenhum tipo de volume que lhes seja entregue por um desconhecido no recinto do aeroporto ou próximo a ele. Já é notório para quem quer que seja que o perigo advertido e a insegurança estabelecida têm a ver com a forte possibilidade de que o envoltório em questão contenha drogas, armas ou explosivos. 
A convicção intensamente transmitida é que a aceitação desse “vulto” pode colocar imediata e consideravelmente em risco, não só a vida do “amável” companheiro de viagem, mas também a de todos os ocupantes do veículo de que se trate e a de (quem sabe?) de outros aos quais o presumido produto ou objeto transportado pode alcançar.
Em realidade, as provas de que essa desconfiança é plausível e as precauções indispensáveis, se multiplicaram durante os últimos anos em trágicos e truculentos atentados.
Se bem que seja possível configurar muito laboriosamente minuto após minuto, mediante as contribuições do futurista aparato planetário de redes eletrônicas que vigiam incessantemente o mundo, um plano de rotas de maior ou menor periculosidade possível, é inviável torná-lo inteiramente seguro e excluído de perigos. Pelo momento, e especialmente em rotas e em faixas comprometidas com conflagrações ou tensões em plena atividade, é marcadamente recomendável ter, pelo menos, esses perigos em mente, persistentemente, senão estar em pleno alarme, conforme os casos.
É neste ponto em que a “medida” do “tipo” e do “grau” de segurança ou insegurança manifestada pelos passageiros, em relação às condições de risco declaradas “objetivas” pelos sistemas de segurança (uma de cujas especialidades é equivocar-se) é uma fonte colossal de observações acerca da “natureza” humana.
É certo que o principal recurso do Terror é o de fazer crer a seus destinatários que é capaz de uma ubiqüidade da qual em realidade carece e dessa forma induzir a uma submissão e a uma paralisia infinitamente maior do que a que pode difundir. Não obstante, é preciso reconhecer que o principal aliado do Terror não é a coragem, senão a infinita diversidade da futilidade humana.
Essa infinita diversidade se resume em seis ilustrações:
1) Porque é preciso justo agora fazer turismo ao Sagrado Sepulcro ou ao Muro das Lamentações. 
2) Porque devemos visitar justo agora nossos parentes longínquos na Colômbia ou no Líbano?
3) Porque há quem se empenha em ignorar, justo agora, por exemplo, que viajar pela Costa Rica em ônibus é mais seguro que fazer um passeio em aeronaves pelo Irã, Síria ou Kênia?
4) Porque temos que saborear pessoalmente, justo agora, os cenários mais encarniçados, se podemos ver os atentados pela televisão e se, para participarmos, do ”coro” mais que para fazer donativos aos movimentos de protesto contra os massacres? 
5) Será que há quem crê que um fluxo firme e denso de viajantes desanimará a delinqüência ou o terrorismo?
6) Por último: qual será e tipo e o grau de insegurança que é preciso experimentar para preferir nosso dormitório, (onde raríssima vez entrou uma bala perdida), aos territórios do Terror, onde rara vez se perde alguma?...
Um amigo recentemente nos dizia:
- “Nada me impedirá de fazer a vida que elegi”.
E é claro que se referia a uma vida prazenteira e alegre para viver, a qual não cederia a nenhum dos difundidos prazeres estatisticamente perigosos da contemporaneidade.
Outro amigo, já muito “viajado” e experimentado nos dizia, pelo contrário, que havia aprendido com o tempo que no mundo há muitos mais lugares parecidos que diferentes. “A vida atual massificou tanto as diversões e prazeres que, a miúdo, basta experimentar uns poucos para saber como são todos. 
O que atualmente estamos perdendo é o chamado “mundo interno”, quer dizer, uma fecunda e audaz relação conosco mesmos. Não é que a mesma careça de perigos, mas não são os de morrer assaltado por púberes molambentos ou por fanáticos fundamentalistas. 
A chamada “segurança” como todo bem escasso se valorizou no mercado e, freqüentemente, o problema consiste em que, para ganhar o que custa a segurança é preciso trabalhar em condições e intensidades de alto risco. Por outro lado, quanto mais medidas ostensivas de segurança adotamos, mais elas se tornam supostas evidências de que temos riquezas para proteger. Esses “sinais” são convites para sermos atacados sendo que, frequentemente somos agredidos por aqueles ou aquele que armamos para guarnecer-nos.
Como a sempre utópica segurança está se tornando cada vez mais inalcançável, só nos ocorrem duas opções mais ou menos dignas: ou nos retiramos para lugares geográficos e íntimos nos quais os riscos, a violência e a morte são altamente improváveis e nos dedicamos a ser melhor do que somos ou, se vamos morrer, que seja lutando ativamente contra a insegurança humana e por uma vida digna para todos.

Aceita-se participar de uma investigação cômica: marque com uma cruz qual prefere:
Ser médico sem fronteiras? ( )
Meditar em um refúgio antiatômico secreto? ( )
Ganhar o prêmio FIDELIDADE da American Aerolines por milhas turísticas recorridas? ( )

sexta-feira, 15 de fevereiro de 2008

1 - O PROBLEMA DA HOMOSSEXUALIDADE FEMININA NAS ORGANIZAÇÕES TOTAIS, ESPECIALMENTE AS CARCERÁRIAS.

Por Gregorio Baremblitt


É desnecessário dizer que a questão da homossexualidade como singularidade de eleição amorosa sexual está longe de ser um problema resolvido nas sociedades modernas. Obviamente houve, nesse sentido, uma série de transformações que vão desde a aceitação relativa no imaginário popular, nos costumes, na moral dominante e até no campo jurídico. Essas modificações se traduzem em uma tolerância maior nos aspectos da tomada de consciência, na recepção nos lugares de trabalho e na possibilidade de estabelecer amizades ou pelo menos vínculos benévolos entre os heterossexuais, os homossexuais e os chamados “transexuais”. 
Continua havendo mundialmente bastante prejuízo a respeito, especialmente por parte dos grupos e pessoas pertencentes a círculos religiosos que proscrevem tais práticas, assim como algumas instituições tradicionais, tais como as forças armadas, as igrejas, o poder judiciário, etc. Contudo, tem-se tido notícias de casos, especialmente na Inglaterra e nos EEUU, em que componentes das mencionadas organizações reivindicaram como normal sua condição e escolha de companheiro. 
Tal reivindicação, algumas vezes, teve que processar-se pela via dos dispositivos judiciários das respectivas agrupações e obtiveram resultados favoráveis. 
Vários países desenvolvidos, especialmente alguns nórdicos e outros como Holanda, assim como, segundo temos notícia, o próprio Reino Unido, já aceitam a legalização dos matrimônios homossexuais, lhes permitem a adoção de “filhos” e até regulamentaram o direito à herança ou as diversas modalidades de divisão de bens, em caso de separação ou de divórcio. 
De todas as formas, a comunidade homossexual tem certa tendência a definir espaços de residência, de trabalho e de diversão que lhe são exclusivos, configurando ainda morfologias urbanas de guetto, apesar de que, em geral, os mesmos são fundados e preservados pela própria vontade dos homossexuais e não tanto por imposição da sociedade heterossexual dominante.
É claro que isso coexiste com a ocorrência de diversos graus de discriminação, que vão desde a exclusão dos homossexuais de diversos âmbitos familiares, sociáveis, laborais, de residência, etc. Também continua havendo atitudes muito violentas contra os homossexuais quando os mesmos associam sua característica sexual com o exercício de variadas modalidades da prostituição, proselitismo ou o exibicionismo. 
Repetidamente acontecem agressões aos travestis e a outras modalidades da homossexualidade prostituída, que vão desde as físicas até o homicídio, a miúdo inteiramente gratuito, quer dizer, sem uma atitude por parte dos agredidos que justifique tal hostilidade. A mesma provém geralmente de grupos machistas, neonazistas, punkys, ou até de seitas religiosas fanáticas.
É importante fazer constar que a Sociedade Psiquiátrica Norte-americana já faz vários anos atrás eliminou da lista de quadros psicopatológicos a homossexualidade, quer dizer, que deixou de considerá-la uma doença, para entendê-la como uma idiossincrasia erótica sui generis.
Por outro lado, nos lugares em que o conflito entre as minorias homossexuais e as maiorias heterossexuais se cronificou, conta em sua história com diversos episódios de agressões mútuas com conseqüências graves, a reação continua sendo de incompatibilidade absoluta e os eventos de alto grau de violência tendem a suceder-se ininterruptamente.
Tampouco deixa de ser notável a influência que produz o fato de que muitos homossexuais são bi ou polissexuais, o que tende a diluir a polarização, tanto identificatória como a discriminativa das maiorias sociais heterossexuais.
Em algumas sociedades, os homossexuais, travestis, etc., se destacaram em determinados campos “respeitáveis” da sociedade heterossexual, considerados especialmente dignos e elevados; tal é o caso de algumas atividades artísticas, especialmente a dança clássica ou popular, a composição, o canto e a música do tipo pósmoderno ou a literatura. A moda ‘unissex” alcançou um grau de difusão e de aceitação relevante, sendo que propicia uma indiscriminação que chega até a favorecer a polissexualidade como um valor, ainda que, provavelmente, essa benevolência dissimule seu verdadeiro significado prevalentemente mercantil. Também é preciso recordar que diversos tipos de homossexuais se destacam “atuando” como tais em diferentes representações teatrais ou cinematográficas, nas quais têm tido particular êxito em peças de tipo burlesco, satírico, cômico, paródico, etc.
Muitos homossexuais chegam a ocupar cargos de alta hierarquia em todo tipo de atividades, sendo que, em geral, ou mantêm sua predileção sexual em sigilo, ou, pelo contrário, se rodeiam de subordinados da mesma condição com os quais mantêm variados tipos de relações sexuais e afetivas.
A associação entre homossexualidade e sadismo ou paranóia não é nada infreqüente entre os ocupantes de altos cargos que, ao mesmo tempo que perseguem a homossexualidade, a praticam. Veja-se, por exemplo, o caso de Edgar Hoover, diretor reiteradamente reeleito para o maior organismo de inteligência norte-americano. 
Determinado grupo social de homossexuais costuma manter um tipo de relação especialmente promíscua, como a que acontece nas “saunas” e outros estabelecimentos de encontro transitório e anônimo entre pederastas. A associação que se estabeleceu entre tal promiscuidade e a difusão das enfermidades infectocontagiosas venéreas foi um fator bastante desfavorável para a imagem social dos homossexuais, em que se mesclam os prejuízos com o rechaço mais ou menos fundado acerca do potencial epidemiológico dos citados estabelecimentos e os costumes sexuais.
Quando os homossexuais somam em sua condição de tais outras que são habitualmente discriminatórias (homossexuais negros, orientais, islâmicos, judeus, pobres, etc.), é claro que os níveis de discriminação crescem em uma dimensão proporcional.
Por complexas razões de ordem psico - socio - antropológicas, a homossexualidade feminina ou lesbianismo, é, em geral, menos discriminada que a masculina. Especialmente quando, no par de lésbicas, a distribuição de papéis não implica na masculinização ostensiva de uma das participantes, o rechaço provocado e evidenciado pela comunidade heterossexual é bastante mais moderado e até superado nos círculos culturalmente sofisticados.
Em um sentido amplo, podemos afirmar que a polissexualidade e a homossexualidade vêm adquirindo um grau de aceitação social crescente, e que, dentro de limites determinados, o que atualmente não se perdoa na condição homossexual, é, predominantemente, sua associação com a prostituição, a exibição e o proselitismo (dentro de certos limites e modalidades), assim como qualquer classe de vinculação com o delito e a violência. O caso das Forças Armadas, da Policia, das Iglesias e outras organizações verticais, é sempre mais intolerante. 
Como é sabido, tal “tolerância” e até simpatia e afinidade com os homossexuais por parte da sociedade e do estado contemporâneos não é nenhuma novidade (ainda que tenha algo a ver com o aumento de seu poder aquisitivo e sua condição de contribuintes e votantes) porque é por demais sabido que, em certas culturas históricas, entre elas a grega, a romana, fundantes da civilização ocidental, tal índole sexual era aceita e até cultivada pelos estamentos, estratos ou classes dominantes.
Provavelmente, a Psicanálise, em alguns de seus conceitos mais audazes, foi uma das principais defensoras da condição homo e polissexual de todos os sujeitos psíquicos, se bem que seja certo que, em outras elaborações freudianas e pós-freudianas, essa “abertura” é desvirtuada por uma série de noções maniqueístas que parecem confundir-se com a moral sexual dominante e os atributos exigidos pelos modelos de “normativização” das sociedades e culturas majoritárias.
Em suma, pode-se dizer que a homossexualidade, em suas diferentes modalidades, está passando lentamente de ser una prática demoníaca, um pecado, um desvio, uma perversão patológica heredogenética e constitucional, uma vicissitude fixativa ou regressiva da evolução psicossexual, ou uma corrente associal conspiratória contra os valores do ocidente, para existir como uma índole, una idiossincrasia ou uma maneira de ser atípica: não recomendável, nem tampouco necessariamente combatível, segregável, curável ou eliminável.
Um dos aspectos mais complicados e delicados da homossexualidade é sua prática nas organizações chamadas “totais” (povoada de comunidades “mais ou menos” confinadas) como são os conventos, os hospitais de grande internação, especialmente os psiquiátricos, os estabelecimentos isolados do tipo das minas ou das plataformas de extração de petróleo, os quartéis, e como resulta óbvio, os internatos educacionais e as prisões.
Se a homossexualidade pode qualificar-se como transitória ou permanente, como variável ou fixa, como apenas genital ou integral, etc., as modalidades verdadeiramente problemáticas são as que são obrigadas, facultativa ou forçadamente, pelas circunstâncias.
É claramente sabido que, nas organizações de reclusão prolongada e imposta, entre as que se destacam claramente as carcerárias, a homossexualidade adquire, a miúdo, as associações exibicionistas, delitivas, prostituintes e forçadas, às quais nos referimos anteriormente.
Um dos principais temores da condenação carcerária por parte dos sancionados com pena de reclusão é a perspectiva, em muitas ocasiões, inevitável, de serem submetidos a vexames sexuais, estupro, violação, etc. 
Tal prática é executada ativamente pela maioria dos detidos, por mais que se atribuam a si mesmos as características de uma virilidade acima de toda dúvida, devido à qual a privação forçada de relações heterossexuais seria como uma espécie de “autorização” biológica de apelar para qualquer meio para descarregar suas necessidades eróticas.
As vítimas de tais abusos se dividem entre aquelas que têm alguma predisposição notória ou ostensiva para a homossexualidade ativa ou passiva, ou simplesmente para as que não encontram forças e ou outros recursos para defender-se desses abusos. As violações sexuais nos presídios masculinos podem adotar uma tônica que vai desde as “mútuas prestações voluntárias recíprocas” para aliviar as tensões sexuais até à perpetração dos estupros reiterados e agressivos, como represália pelo não cumprimento de regras coletivas da massa de presidiários, geralmente destinadas à manutenção de redes de comércio, tráfico de drogas, planejamento ou execução de fugas, ou simplesmente a manutenção de um sistema de hierarquias dentro da “socialização” dos reclusos. 
Alguns desses ataques sexuais cruéis e lesivos são prescritos simplesmente como sanção do coletivo pelo tipo de delito pelo qual os condenados foram punidos, especialmente os raptores, estupradores e/ou assassinos de menores, de mulheres ou de incapacitados. A “condenação” do coletivo de reclusos inclui, nesses casos, além da violação sexual, torturas e maus tratos diversos que chegam até o assassinato. A denúncia dessas práticas por quem quer que seja alguma de suas vítimas dá lugar a represálias muito piores que as agressões iniciais.
No caso de que a predisposição à homossexualidade da vítima seja ostensiva, a mesma pode converter-se em um recurso para obter proteção ou outros benefícios, e, em geral, não necessariamente vai acompanhada de violência. Obviamente, outro dos fatores que obrigam a vítima a não denunciar os citados abusos é simplesmente a esperança de que os mesmos nunca sejam divulgados nem conhecidos por suas esposas ou maridos, seus familiares em geral e a sociedade em seu conjunto.
A homossexualidade feminina, seja nos hospitais, internatos de estudantes, nos conventos de monjas ou nas prisões de mulheres, adota modalidades sumamente variadas. O habitual é que a reação dos outros internos e das autoridades constituídas esteja dada pelo caráter da organização ou estabelecimento e pelas convicções morais das autoridades encarregadas. Nos hospitais, o critério médico é o de uma evitação severa, ( embora que mais ou menos respeitosa) baseada, seja na crença de que se tratem de manifestações patológicas ou não, mas que, invariavelmente podem afetar a saúde ou a cura das outras internas. Nos conventos, a repressão é drástica, embora não violenta, e pode concluir com a expulsão das protagonistas do ato homossexual por ser considerado altamente pecaminoso e passível de contágio ”por mau exemplo”.
Nas prisões de mulheres, curiosamente, as relações lésbicas são ignoradas e até toleradas, devido a que não implicam, necessariamente, em perigo de transmissão de enfermidades infectocontagiosas venéreas, nem requerem inevitavelmente a força ou a violência para sua realização, assim como porque não supõem perigo de gravidez.
Pode-se afirmar que, nos estabelecimentos carcerários, quando os atos sexuais lésbicos não envolvem uma imposição forçada, nem violência física ou moral em sua efetuação, nem exibicionismos desafiantes, nem proselitismo manifesto, nem promiscuidade exagerada, nem as detentas, nem as autoridades costumam tomar medidas destinadas a impedi-las, castigá-las nem proscrevê-las, apesar de que tampouco as vejam com benevolência nem as favoreçam.
A respeito, é importante recordar que a enorme maioria dessas jovens, ou já estavam prostituídas antes de sua condenação, ou já haviam sofrido estupro reiterado e violento por parte de seus pais biológicos, dos amantes de suas mães, dos irmãos maiores, etc. A miúdo a exacerbação do desejo e das práticas homossexuais exprime sua resistência deslocada ao estado de privação de liberdade, e pode ser também, sem dúvida, uma expressão de repúdio, consciente e deliberada ou não, ao universo prevalentemente masculino extramuros que as prostituiu, as agrediu, as explorou, dominou e desacreditou de inumeráveis maneiras, invariavelmente mediante o uso de diversas formas da força e com uma hipocrisia que exigia a privacidade, o sigilo e o consentimento dissimulatório. É a dupla moral: religiosa, familiar, pública e jurídica que marcou essas vidas com o selo do ressentimento e o desejo de vingança. 
Já nas situações contrárias intramuros, opostas às antes descritas, quer dizer, quando existiu imposição forçada, lesão física ou pisicomoral, comércio de dinheiro, de cigarros, alimentos, cosméticos, drogas ou privilégios, e finalmente, quando essa idiossincrasia dá lugar a lutas por cuidados ou se converte em instrumento de protesto, revolta, subversão, tentativas de fuga e outras cumplicidades, tanto as presas como suas guardiãs imediatas ou superiores, costumam tomar medidas judicialmente fundadas ou simplesmente preservadoras do cuidado da ordem institucional vigente.
Uma dessas vicissitudes mais habituais na transformação dos amores, e/ou dos atos sexuais lésbicos, em razões para a repressão e o castigo, está dada exatamente pela reação dos guardas masculinos ou femininos à sua própria exclusão no universo de escolhas sexuais e os prazeres das detidas, ainda que isso não seja, a miúdo, nem consciente, nem admitido pelos agentes em questão.
A repressão branda ou severa de manifestações da preferência homossexual feminina “inofensiva” pode, eventualmente, causar sua exacerbação e sua transformação em motivo de reivindicação “militante” e violenta, dando lugar a alterações da ordem carcerária muito mais perigosas e destrutivas que as próprias da modalidade lésbica de relacionar-se sexual e afetivamente no marco de reclusão das instituições totais.
Talvez a única recomendação que os “experts” podemos propor a respeito desse problema é um conjunto de atitudes, explicações e medidas destinadas a mostrar às detentas que, se a relação lésbica é, em última instância, um vínculo humano, a mesma deve ser realizada de maneira e em condições em que predomine nelas o prazer, o cuidado da saúde, a realização do amor, o bom gosto e a discrição das protagonistas e de seu ambiente.
Proibir ou punir as relações heterossexuais ou não heterossexuais em condições de confinamento, quando são voluntárias, adotando cuidados preventivos infecto contagiosos e de embaraço e que se pratiquem nas melhores condições de privacidade outorgadas pelos respectivos estabelecimentos é crime. Como também e crime a montagem de dispositivos rentáveis destinados ao “alivio” sexual de funcionários alocados em lugares distantes (veja-se “ As visitadoras”, de Vargas Llosa). 
Essas escolhas e práticas sexuais deveriam ser universalmente protegidas por leis jurídicas e normas institucionais explícitas dos direitos humanos dos confinados, como já existem parcial y arbitrariamente sob o nome de visitas “ intimas” etc Tais leis e normas devem fazer respeitar toda a variedade de modalidades sexuais que não impliquem dano moral ou físico inerente, maior ou irreversível, especialmente no caso da homossexualidade feminina em que tais prejuízos são “naturalmente” menos ou nada prováveis.
O trato peculiar dado para bem ou para mal nas instituições totais á homossexualidade (especialmente a feminina) e um analisador incalculavelmente importante das infinitas modalidades da in - humanidade humana.